Exames
Passou o mês de Maio sem novidades, neste escorregar vertiginoso até ao Portugal de há quarenta anos, onde teimam em colocar-nos.
Passou Maio com Fátima a 13, o Benfica a 14 e os exames da quarta classe a 19 e 21.
As eleições a 25, sem graça e a marcarem “necessidades de entendimento” entre os dois maiores partidos europeus, assim à laia de partido único.
Por cá, o desencanto, a abstenção recorde de um punhado de gente sem esperança que pensa que a democracia é isto.
Mas é a escola, que sempre pensei como estrada de futuro, aquilo que mais me preocupa. Este regresso ao passado, não estaria mal se fosse transporte de festa à década de oitenta, onde curiosidade e sonho, fazia de cada sala de aula um laboratório de criatividade.
O património das escolas de Magistério, dos anos que se seguiram aos cravos, foi desmantelado. As escolas de formação de professores, repletas de especialistas, enveredaram por um academismo pacóvio, que terminou na ignorância sobre a monodocência, um pouco (ou muito) como os padres da igreja católica que fazem formação a jovens casais frente ao matrimónio. Quantos professores com pelo menos dois anos de docência no primeiro ciclo (e já é pedir muito), fazem parte dos quadros das escolas de formação de professores, sejam universidades ou politécnicos?
Acabam assim metendo a mão numa massa que desconhecem e para a qual não têm a noção da quantidade de fermento necessário.
Desrespeitam-se os processos educativos, desconhecem-se as etapas de desenvolvimento da criança, abafa-se a psicopedagogia, ignoram-se os diferentes ritmos de aprendizagem, destroem-se os recursos e as condições para um ensino individualizado, finge-se desconhecer ou desconhece-se mesmo, a importância do grupo de pares que estas idades comportam, e forma-se uma caldeirada cinzenta, onde prevaleceram os complementos de formação, a troco de uns trocos a mais no ordenado e o poder glamoroso de colocar um Dr. nos livros de cheques.
Cada vez se necessitam mais professores primários, sem vergonha e com orgulho de o serem, que continuem a assegurar o único escalão de ensino que estava organizado.
Esse desconhecimento da monodocência, impede que consigam levar “os maomézinhos” à montanha, pelo que resolveram, atirar todo o peso da montanha para cima dos “maomézinhos” de nove anos.
O ataque à monodocência que tem sido ensaiado, não é mais do que a incompetência de quem desconhece por completo o primeiro ciclo, hoje em dia, não só governantes e formadores, mas já também professores que foram formados ou que fizeram e fazem formações no cinzentismo da academia.
Os exames no primeiro ciclo são uma aberração não só do ponto de vista psicopedagógico, mas também uma fuga para a frente (ou para trás?) numa escola inicial que perdeu o rumo e a essência.
Muitos professores gostam, deste poder policial de vigiar exames, mãos atrás das costas como os pombos de Lobo Antunes, exercendo um poder absurdo não conquistado pelo respeito do reconhecimento do saber, mas pelo adultismo de uma hierárquia forçada numa escola cada vez com mais degraus.
Esquecem-se os processos de aprendizagem, substituidos por baterias de testes manipulados pelas editoras que são aplicados dia após dia para preparar estas crianças para o exame final, com um peso de 30%, que obriga pais e alunos a diarreias e xanax.
Que se não zanguem os professores que acuso deste gostinho, pois em alguns agrupamentos, caiu-se mesmo no ridículo de, por forma voluntária e por decisão maioritária dos docentes do 1º ciclo, serem aplicados estes exames ao segundo ano (segunda classe). Falamos de crianças de 7 e 8 anos, a quem o GAVE, agora IAVE forneceu os exames, provas intermédias como lhe chamam, com “penes” e tudo, talvez na esperança de no futuro enviarem cassetes, transformando os professores em monitores, de uma velha Telescola, quem sabe?
Tenho saudades de ouvir cantar nas escolas do ensino primário, de ver misturar as cores e usarem~se os pinceis, dos contratos de trabalho, dos jornais de parede, das assembleias de turma onde se educava para a cidadania e porque não, da Maria dos Olhos Grandes que conheceu os dois lados do mundo e do autocolante com a cara de um palhaço que dizia “Queremos teatro na nossa escola já”.
Depois, queixem-se da abstenção.
Ganhe quem ganhe as próximas eleições legislativas, terá urgentemente que olhar para o grave problema instalado na educação, pois por este caminho, temo que comecem também a fazer exames no ensino pré-escolar para acesso ao primário, e com o rigor e o método apregoado, a serem vigiadas as provas por agentes da Guarda Nacional Republicana.
Aragonez Marques
NOTA:
Sou pai de uma menina de sete anos aluna da escola espanhola, que terá que ingressar no ensino deste Governo de Portugal no próximo ano letivo.
Tem no seu estabelecimento de ensino primário, aqui tão perto, do outro lado do Guadiana, português e inglês, aprende música e dança. Faz teatro. Tudo na escola. Sem exames no 1º ciclo, obviamente, que estes pioneirismos só a nós, génios do retrocesso, competem.
Temo por ela, pelo que escrevo como pai e não como professor.
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